Autores: Mary Garcia Castro, Miriam Abramovay, Alessandro De Leon
Ao longo das últimas décadas, o tema juventude vem se tornando foco de atenção dos governos, de organizações internacionais e de estudiosos de diversos campos, tanto no Brasil como em outros países. Aqui, o assunto vem progressivamente atraindo investimentos, tanto em estudos e elaboração de políticas e programas, como em outras estruturas, como montagem de organismos governamentais (a Secretaria Nacional de Juventude e o Conjuve, entre outras), e construção de redes, sejam elas na sociedade civil ou amparadas por investimento do setor privado.
Lamentavelmente, são fontes freqüentes de preocupação com a juventude os dados que demonstram o envolvimento de jovens em violência; o desemprego; o abandono; o baixo desempenho escolar; a propagação das DSTs/aids; a gravidez sem amparo; o consumo de drogas; e as carências quanto à participação e às possibilidades de exercício da cidadania. Além disso, as exclusões de várias das oportunidades de lazer e de formação cultural e política, assim como a baixa qualidade dos serviços públicos, particularmente da escola, confirmam um triste prognóstico socioparticipativo para a juventude brasileira.
A impressão é de um poço sem fundo: se, por um lado, há investimentos em formação de capital cultural, montagem de programas e engrenagens político-institucionais sobre e para os jovens e gastos de recursos privados e públicos, por outro, o que se vê é um crescente aumento de notícias sobre violência envolvendo jovens, desemprego e exclusões várias ou inclusões perversas para os jovens e para a sociedade em geral. Ao mesmo tempo, multiplicam-se ações e programas variados e com alcance diverso em termos de números de jovens neles incluídos. Contudo, tem-se como hipótese (que não necessariamente faz parte do escopo desta proposta) que os enfoques e a formatação de vários desses programas são problemáticos quanto à sua eficácia em médio e longo prazos. Por exemplo: em muitos programas que focalizam qualificação e incluem informática, tanto o currículo como a extensão deixam a desejar, não necessariamente colaborando para uma inclusão digital mais sólida, nem para o exercício da criatividade, e tampouco para a mobilidade no mercado de trabalho. Esses programas apresentam eficácia e eficiência discutíveis, para não mencionar a orientação a varejo de muitos deles, beneficiando pouquíssimos jovens.
É consenso entre estudiosos que faltam avaliações dos vários projetos em andamento e mais reflexão sobre o que vem dando certo e o que conta com eficácia relativa. Ainda que avaliações não sejam propostas no âmbito deste trabalho, a sistematização de documentos básicos nacionais e internacionais pode colaborar com parâmetros para tal empreendimento no futuro. Note-se ainda que as esparsas avaliações de projetos no Brasil baseiam-se em percepções de jovens. Essas avaliações reconhecem a identidade de sujeito ativo, ator do/em desenvolvimento, mas não são questionados, contudo, os parâmetros utilizados para construir essas percepções. Dessa forma, além de discutir os parâmetros de políticas, este trabalho também tem a finalidade didática de formação em políticas de juventudes, inclusive para o conhecimento e a discussão de experiências como as que se dão no plano das parcerias público-privadas. De fato, o relatório do Banco Mundial, um dos eixos deste estudo, fornece um rico portifólio de experiências no campo de políticas de juventudes. Organismos internacionais, como o próprio Banco Mundial em seu relatório, e vários estudiosos nacionais (como Novaes, Castro, Abramovay, Abramo, Sposito, Camarano, Madeira, Heilborn e Carrano) alertam sobre a importância de trabalhar a juventude conjugando-se o singular e o plural – o comum e a diversidade de grupos juvenis, simultaneamente.
Tais autores enfatizam a importância de enfoque sobre:
■ transições (Banco Mundial, 2007; Camarano et al., 2006);
■ identificação de etapas estratégicas, recorrendo-se, por exemplo, à idéia de
que as políticas públicas precisam ter “lente juvenil”, ou seja, preocupar-se
com o que é deixado aos jovens como uma geração (Banco Mundial, 2007);
■ ciclos de vida e enfoque geracional/juvenil (Castro, 2004).
Trata-se de discussão sobre o que é próprio da juventude, como estudar, formar-se criticamente e ter linguagens que afirmam interesse cultural e por lazer e busca por autonomia. Outro enfoque a ser considerado é a ligação entre dimensões como trabalho, estudo e cultura, ou a avaliação de efeitos cascata de intervenções políticas em uma área específica sobre outras, considerando nexos entre distintas dimensões, e a identificação de pontos estratégicos de intervenção (Abramovay e Castro, em várias pesquisas publicadas pela Unesco até 2006, e particularmente em Abramovay e Castro, 2004). Nota-se também que, em vários documentos recentes de políticas para a juventude (Projovem, Prouni, Primeiro Emprego/Consórcio Social da Juventude, Segundo Tempo), assim como na produção do Conjuve, no Plano Nacional de Juventude, entre outros, é comum serem destacados conceitos do léxico de uma cidadania ativa, como participação, exercício do controle social e jovens como atores do desenvolvimento. Contudo, a operacionalização desses conceitos e sua factibilidade ainda têm sido pouco elaboradas, em termos de informações, recursos e capital cultural dos jovens. Mas, como a cidadania ativa requer conhecimento de alternativas e modelos de políticas, é importante indicar um leque com várias opções de políticas para a juventude por meio de estudos comparativos e sistematizadores. Não se pretende, aqui, solucionar e preencher várias lacunas, mas colaborar com as redes de intercâmbio e com o aumento da divulgação de experiências bemsucedidas, internacionais e nacionais, além de focalizar pontos estratégicos que
colaborem melhor para a eficiência de vontades políticas do setor empresarial e da sociedade civil em geral – particularmente, organizações juvenis – quando se fazem reflexões sobre as políticas nacionais. Desse modo, os autores têm por objetivo, pela análise comparativa, ou seja, com uma leitura por análise de discurso, de temas comuns e dessemelhantes, contribuir para a montagem de sistemas de avaliação de políticas públicas de juventudes, não só identificando enfoques, métodos e síntese de propostas contemporâneas, como também discutindo textos básicos de alguns projetos federais para esse segmento da sociedade.
Assim, resumidamente, a análise aqui proposta tem por objetivos:
■ fornecer um panorama do que está se falando sobre política de juventudes
no Brasil e no mundo;
■ focalizar pontos estratégicos que colaborem mais para a eficiência de vontades
políticas do setor empresarial e da sociedade civil em geral, aumentando
o diálogo entre os diferentes atores;
■ colaborar para a montagem de um sistema de avaliação de políticas públicas
de juventudes, pela análise comparativa, que identifique enfoques, métodos
e sínteses de programas de políticas direcionadas a esse público.